Você certamente portou uma arma ilegal, destinada para a caça de animais silvestres, quando era criança - você só não sabia disso. Bem, pelo menos é assim que pensa o povo do IBAMA. Pois veja o seguinte caso: uma loja de brinquedos, estabelecida na cidade de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, foi multada pelo IBAMA - o tal órgão responsável por cuidar do meio ambiente no Brasil. Você pode se perguntar: mas por que diabos um órgão que lida com a natureza iria multar uma loja de brinquedos? Pois é, meus amigos: o Brasil realmente não é para amadores.
O motivo alegado pelo IBAMA para a punição aplicada foi a venda, por parte da citada loja, de um modelo de estilingue da marca Tigrão. Sim, um estilingue. Ao todo, 56 unidades foram apreendidas, e o estabelecimento foi multado em R$ 11.400,00. De acordo com o órgão fiscalizador, “a mercadoria não pode ser comercializada por se enquadrar como arma de caça, perseguição e destruição da fauna silvestre”.
Você sabe o que é um estilingue: um objeto em formato de forquilha, feito de madeira ou de outro material, em que se prende uma tira de borracha – ou algo semelhante – com a finalidade de disparar projéteis a uma pequena distância. No Brasil, são chamados também de bodoques, setas e fundas. Existem registros arqueológicos demonstrando que, 6 mil anos atrás, seres humanos já faziam e usavam estilingues, na região da atual Turquia. Ok, os bodoques podem ser usados para matar passarinhos. Mas provavelmente você passava a maior parte do tempo usando seu estilingue para jogar pedras ou mesmo mamonas em seus amigos.
A loja, por óbvio, acionou a justiça estatal para recorrer dessa multa. E, acredite ou não, esse caso está tramitando desde 2016. Pois é: nem as preguiças do filme Zootopia são tão lentas quanto a justiça brasileira. De qualquer forma, o juiz de primeira instância decidiu em favor do IBAMA, como era de se esperar - embora tenha reduzido o valor da multa para R$ 6 mil. Os donos da loja, por serem brasileiros e não desistirem nunca, recorreram da decisão ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
No final de julho deste ano, o desembargador, responsável pela relatoria do processo, suspendeu a aplicação da multa. O magistrado entendeu que o estilingue, que tinha inclusive sido aprovado pelo INMETRO, conforme selo adotado em sua embalagem, não podia ser considerado uma arma. Contudo, essa decisão é provisória, e o caso ainda vai ser julgado pela 4ª turma do Tribunal, sendo que novos recursos poderão ser feitos. Ou seja, essa novela ainda pode ter vários capítulos.
Imagina só, que coisa mais linda: um bando de desembargadores, pagos a peso de ouro, decidindo se o estilingue deve ser considerado uma arma de caça ou não. Essa história seria cômica, se não fosse trágica. Bem, na verdade, ela é cômica sim - talvez trágica apenas para a loja de brinquedos em questão, que teve que arcar com as custas de todo esse processo. E que pode, no fim das contas, ter que pagar essa multa de qualquer forma.
Muitas perguntas podem ser levantadas a respeito desse caso. A primeira delas é: a coisa precisava ir tão longe? Pense sobre o caso: um estilingue, vendido em uma loja de brinquedos, fabricado por uma marca chamada “Tigrão”... parece mesmo ser uma arma com potencial lesivo para o meio ambiente? Toda essa história poderia ter sido resolvida pelo próprio bom-senso dos funcionários do IBAMA. O avanço desproporcional da questão só nos mostra que a razoabilidade não é uma virtude do estado brasileiro.
E aí chegamos a mais outra pergunta: por que existem tantas multas no Brasil? Praticamente qualquer atividade, por mais trivial que seja, está sujeita a multas. Afinal de contas, qual é a finalidade de um órgão como o DETRAN, se não aplicar multas? Andando pelas estradas brasileiras, você pode ser multado por não ligar o farol, por não usar cinto de segurança, por estar com os vidros escuros demais ou por não ter um extintor de incêndio. Quer dizer: não tenho muita certeza quanto a este último item, as leis mudam muito depressa aqui no Brasil.
O mesmo pode se dizer da Receita Federal. Você precisa declarar sua renda, anualmente, para esse órgão burocrático - que já sabe previamente qual é a renda que você tem que declarar. Agora, se você errar algo em sua declaração, você será multado por isso. Mas se eles já sabem quanto você deve, porque eles simplesmente não te cobram de uma vez? Pois é: trata-se da indústria das multas, funcionando a pleno vapor, aqui no Brasil.
E com o IBAMA a coisa não seria diferente. Fala a verdade: você realmente acha que o meio ambiente brasileiro está a salvo por conta da existência desse órgão estatal? Coisas realmente prejudiciais à natureza, como desmatamento, queimadas e tráfico de animais silvestres continuam acontecendo, ao arrepio da lei. Contudo, certamente você verá mais empenho nos burocratas do IBAMA para multar construções de jogadores famosos e empresas de consultoria ambiental. Duvida? Pois corte uma árvore em sua propriedade privada para você ver o problemão que você vai arranjar com o estado!
Temos, a partir daí, um terceiro questionamento: por que existem tantas regulamentações no Brasil? A verdade é que são essas normas legais que justificam a indústria das multas. Afinal de contas, para que tudo possa ser multado, tudo precisa ser regulamentado. Veremos, então, até mesmo algo simples e inocente, como um estilingue, precisar de selos e autorizações para ser comercializado. É bem possível que, na sua infância, você tenha feito seu próprio estilingue em casa, de maneira artesanal. Mas isso pouco importa: conforme anteriormente explicado, o estado não se mantém pela lógica ou pela razoabilidade, mas apenas pela força bruta.
Por fim, ainda podemos levantar a questão a respeito da demonização das armas, um processo que está em curso acelerado no Brasil. Afinal de contas, que tempos são esses, em que um bodoque é considerado uma arma com potencial para causar danos ao meio ambiente? Se você tem mais idade, certamente você vai considerar esse tipo de coisa ainda mais absurdo. Pense que, em países como os Estados Unidos, era comum que os meninos aprendessem a usar armas de fogo, como espingardas, por volta dos 10 anos. Aliás, esse tipo de armamento era dado como presente, ou deixado como herança, para meninos de pouca idade, principalmente no campo.
No Brasil, a coisa também já foi bastante diferente. Crianças de algumas gerações atrás aprendiam a brincar com espingardas de chumbinho e com estilingues, bodoques, zarabatanas e coisas do tipo. Até porque nosso povo tem traços indígenas, não é mesmo? Porém, os tempos agora são outros: ou as crianças de hoje são mais burras e inconsequentes que as do passado, ou o estado é que cresceu demais, e agora quer mandar em tudo. A partir daí, decorre uma série de problemas: alguns morais, como a perda da virilidade por parte dos meninos, outros éticos, como a limitação da liberdade humana. O pior de tudo, porém, é a normalização da intervenção estatal em nossa vida.
De qualquer sorte, casos como o dessa loja de brinquedos de Santa Maria nos ajudam a lembrar qual é a real serventia do estado e de seus órgãos. Qual é a finalidade do IBAMA: proteger as florestas brasileiras? Não: multar lojas de brinquedos. Qual é a real função da justiça estatal: condenar criminosos por suas ações maléficas? Não: decidir se o estilingue é ou não uma arma perigosa.
Em suma, e na raiz de tudo isso, está a vontade estatal de aumentar o controle sobre a população e, é claro, de arrancar mais dinheiro do povo, por meio das multas. Afinal de contas, como nos ensinaria Ayn Rand, se tudo é criminalizado, então não há um único cidadão que não seja um criminoso. E, mais uma vez, vemos o estado agindo, de uma forma completamente inútil, para prejudicar pessoas que não estavam fazendo mal a ninguém.
Este artigo foi sugerido e escrito por QuintEssência, revisado por Donda e narrado e produzido por QuintEssência.
Fonte: https://visaolibertaria.com/article/0b674f68-081b-474c-9f31-e735a3baecff
https://diariosm.com.br/noticias/policia-seguranca/justica_decidira_se_estilingue_e_arma_ou_apenas_brinquedo_apos_recurso_de_loja_de_brinquedo_de_santa_maria.532917
https://direitoambiental.com/infracao-administrativa-justica-federal-mantem-multa-ambiental-aplicada-loja-de-brinquedos-que-comercializava-estiligues/